Olá!!! Conforme publicamos, no final do mês de setembro, aconteceu em Salvador/BA o 10° Congresso Brasileiro de Dor, que contou com a participação de médicos das mais diversas áreas bem como profissionais da saúde que trabalham com essa temática. E o GAPENDI, lógico, esteve presente nesse evento!!
Eu, particularmente, fiquei extremamente curiosa ao ver na
programação uma mesa destinada para Dor Pélvica Crônica. Ao mesmo tempo ansiosa
sobre como eles iriam focar e abordar esse tema tão amplo e, principalmente, se
iam focar a Endometriose como uma das causadoras da dor pélvica!! Para minha
felicidade, a Endometriose acabou sendo bastante focada nessa mesa! Incluindo a
importância do diagnostico precoce e como deve ser feito esse diagnostico, bem como as dores decorrente da doença que podem interferir no cotidiano da portadora.
DOR
A dor é uma sensação desagradável, um sinal de alerta do
nosso organismo, o qual pode indicar dano, doença ou perigo! Segundo a
International Association for the Study of Pain (IASP) a dor é experiência
sensitiva e emocional desagradável associada ou relacionada a lesão real ou
potencial dos tecidos. Cada indivíduo aprende a utilizar esse termo através das
suas experiencias anteriores.
Além de gerar estresses físicos e
emocionais para o doente e para seus cuidadores, a dor é a razão de fardo
econômico e social para a sociedade. (Prof. Dr. Manoel Jacobsem Teixeira -
Neurocirurgião, Faculdade de Medicina da USP).
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COMO A DOR SURGE?
Quando há um estimulo de intensidade maior do que a que
suportamos, por meio de células
especiais chamadas de Nociceptores, a dor é detectada e transmitida através de
fibras nervosas até o Sistema Nervoso Central, chegando até a membrana que
reveste o cérebro, chamada de Meninge.
É essa membrana que recebe a dor, já que o cérebro não
aguentaria tamanha sensação por ser um órgão de fundamental importância para a vida.
Quando a dor chega a essa membrana, ela atinge duas partes distintas: uma que
é responsável por localizar a dor e a que está relacionada à sensação da dor.
As fibras nervosas que transportam a dor pelo nosso corpo,
às vezes, podem não funcionar corretamente provocando o que chamamos de dor crônica. Em algumas situações, quando
existe lesão dos nervos, essas fibras podem provocar dor de forma anormal, ou
seja, um simples carinho como abraço, uma caminhada a mais, alguma determinada
posição podem provocar a dor intensa.
O QUE É A DOR
CRÔNICA?
A dor pode ser dividida em dois tipos:
· Aguda: é aquela com curto período de tempo, geralmente não passa de três
meses. É facilmente identificada e o
corpo usa ela como sinal de alerta para infecção e inflamação. Exemplos: Dismenorreia primaria, dor de dente.
· Crônica: é aquela que
ocorre por um período superior a três meses, ou quando persiste por um tempo
maior que o esperado após a ocorrência de uma lesão. Pode debilitar e exige
maior atenção por parte de quem está sentindo. Exemplo: Artrites, Endometriose.
E pode ser classificada como:
· Somática: é aquela que
tem origem em ossos, ligamentos e/ou tendões; gerando uma dor mal localizada e de
longa duração.
· Visceral: localizada
em órgãos e cavidades internas do corpo, trazendo uma sensação intensa de dor e
difícil de localizar. Muitas vezes o paciente sente dores em regiões totalmente
diferentes do verdadeiro local da lesão. Exemplo: no ataque cardíaco, a pessoa pode
sentir dores nos ombros, estomago e braço.
· Cutânea: localizada e
de curta duração, como queimaduras de primeiro grau e/ou cortes.
A Dor Pélvica Crônica não se restringe apenas às dores dos
órgãos internos, como ovários, útero e intestino; podem envolver também ossos,
músculos e nervos da parte inferior do corpo humano; e pode ser provocada por:
· Causas
Intestinais:
Síndrome do Intestino Irritável, Doença
Inflamatória Intestinal, Hérnias, Doença Diverticular, Constipação Crônica;
· Causas
Urinárias:
Cistite Intersticial, Infecção Urinária
Crônica, Cistite Actínica, Síndrome Uretral;
· Causas
Ginecológicas: Endometriose, Doença
Inflamatória Pélvica, Massas Pélvicas e Anexiais, Aderências, Adenomiose;
· Causas
Músculo-Esqueléticas: Síndrome Miofascial, Espasmo da
Musculatura do Assoalho Pélvico.
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DOR CRÔNICA PÉLVICA X ENDOMETRIOSE
A maioria dos casos de dor crônica pélvica nas mulheres são
causados pela Endometriose. Seja por conta dos focos ativos da doença ou
decorrente das alterações nos tecidos referentes ao processo aderências e
fibrose. No caso dos focos ativos da doença, os implantes de endometriose
causam uma reação inflamatória que irritam as terminações nervosas ocasionando a dor. Já a presença
de aderências pélvicas e número de intervenções cirúrgicas ajudam a piorar os
sintomas nessas mulheres. Por isso é tão importante ser acompanhada por um
especialista na doença, evitando assim cirurgias desnecessárias. As aderências,
como já foram explicadas aqui no blog, são
como cicatrizes internas que se formam após inflamações ou cirurgias passadas.
Essas cicatrizes fazem com que os
órgãos fiquem unidos uns aos outros, provocando estiramento, compressão e,
consequentemente, dor.
A dor causada pela Endometriose costuma ser debilitante e
se apresenta como cólica intensa, dor em forma de pontada, fisgada, queimação,
peso. Quase sempre constante, se apresenta durante o ciclo menstrual ou até
mesmo fora dele, provoca a irritação da portadora, podendo levar ao pavor só por
imaginar que pode senti-la
novamente. Essa dor implica num declínio da qualidade de vida e
produtiva/laboral da mulher.
Interessante falar que geralmente a portadora de endometriose, em
virtude das dores constantes, acaba desenvolvendo não apenas a dor ginecológica
ou visceral, mas também a dor
músculo-esquelética ou dor somática. Por
isso a importância do ginecologista especialista em endometriose ficar atento
para isso, pois muitas vezes se submete a
paciente a constantes cirurgias em virtude das dores intensas quando na verdade
a dor já se transformou em neuropática.
A dor pélvica crônica, acompanhada
ou não de formigamento, em parede abdominal, membros inferiores e genitália
externa, pode sugerir o comprometimento de nervos e/ou raízes nervosas.
A endometriose pode acometer nervos pélvicos,
comprimindo-os ou lesionando, caracterizando a endometriose
nos nervos cujo exames como ressonância
magnética e ultrassonografia não conseguem diagnosticar com precisão, necessitando de maior atenção dos ginecologistas para a
sintomatologia e possivelmente para um encaminhamento para outro profissional
especialista nessa abordagem.
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Fibrose (nódulo) em N. Hipogástrico esquerdo antes da cirurgia terminar
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A endometriose nos nervos, não é muito freqüente,
e pode ocasionar dores intensas nas pernas e
na região glútea, bem como alterações urinárias e intestinais. O nervo é como um fio de luz que, se
desencapado, pode dá choques, então a dor é caracterizada por ser intensa e
incapacitante, geralmente em forma de choques, queimação, irradiação, caimbrãs
e dormência. Em alguns casos pode haver perda de força nos membros inferiores,
forte desejo urinário e evacuatório. Muitas vezes a mulher sente muita vontade
de ir ao banheiro e vai por diversas vezes, sentindo fortes dores, porém o
conteúdo é muito pouco.
Esses sintomas se assemelham a
outras doenças com origem nos nervos. Devendo ser investigada a presença de
outras patologias para um diagnóstico
mais efetivo.
Por falar em nervos, uma
curiosidade que eu matei nesse congresso em relação à algumas portadoras
sentirem mais dores que as outras foi sanado. A resposta é justamente a
proximidade dos implantes com os nervos. Segundo os congressistas, a pesquisa realizada por dr. Mauricio Abrão, mostrou
que as porcentagens de mulheres com implantes profundos em áreas bastante
inervadas sentem mais dores que as mulheres com
outros tipos de implantes de endométrio. Outra coisa interessante também é que implantes
mais velho têm maior chance de ser infiltrado por nervos, o que geraria mais dor.

Outro fator que pode levar a dor crônica pélvica são os
espasmos dolorosos dos músculos do assoalho pélvico (levantadores do ânus: pubococcígeos, puborretais
e iliococcígeos; coccígeos; piriformes e
obturadores internos) ou as disfunções no assoalho pélvico, que podem ser
lesionados ou estarem fadigados devido a endometriose, aderências e fibrose; ocasionando fortes e intensas dores. Esses espasmos ou disfunção no assoalho pélvico podem causar também o que
chamamos de dispareunia, dor na relação sexual. Motivo de muito sofrimento para
os casais, especialmente as mulheres; além da incontinência urinária e
fecal.
Nesse caso, a fisioterapia uroginecológica entra para
ajudar nesse processo, com eletro-estimulação, massagem do tecido conjuntivo e
a cinesioterapia, ou seja, exercícios. Bem como bloqueios anestésico locais,
realizados pela equipe da medicina/clinica da dor, ou acupunturas. Em outro post,
vamos focar a função, a importância e os benefícios da fisioterapia
uroginecológica e da Medicina da dor em pacientes com endometriose.
Conseqüências da
dor no cotidiano da portadora
Como já dissemos, as mulheres que sofrem com a dor crônica
provocada pela endometriose tem a qualidade de vida abalada, visto que esta
implica no bem estar físico, mental, psicológico e emocional do individuo com
si próprio, bem como com a família, trabalho, amigos. É comum que mulheres que
sofrem de dores constantes por conta da endometriose se afastem dos amigos e
familiares por vergonha ou por estarem sempre com dores intensas, causando a
privação das atividades sociais/lazer.
Quase sempre, por esse mesmo motivo, são os amigos e familiares que a excluem.
O mal provocado pela dor é tao grande, que está acaba se tornando o fator mais
importante do seu dia a dia.

Ausências no trabalho, atestados
médicos, suspeitas ou dúvidas dos colegas de trabalho e chefes são situações
constantes no cotidiano de algumas portadoras e que, também, acarretam em
grande sofrimento. Muitas vezes para evitarem ouvir os comentários
desagradáveis dos colegas e chefes, bem como para não perderem o trabalho por
conta das faltas, muitas mulheres vão trabalhar com dores intensas, o que pode
implicar na diminuição do desempenho deste.
Muitas sofrem por terem que fazer uso de medicações fortes
diariamente e terem que lidar com os efeitos colaterais das mesmas; bem como
com as complicações dessa dor nas atividades laborais. Os remédios exercem funções semelhantes
a da endorfina, que são substancias produzidas no cérebro com a função de
aliviar sentimento de dor funcionando como analgésico natural atrapalhando
assim a comunicação entre os transmissores e receptores. Podemos liberar a
endorfina através de atividades físicas! Quando a endorfina fabricada pelo
nosso organismo não consegue aliviar a nossa dor, é necessário entrar com
medicação.
A atividade física acaba se
tornando nossa grande aliada, não só por liberar a endorfina mas porque ela
ajuda a queimar as famosas gordurinhas do nosso corpo que também são
responsáveis pela produção do estrogênio, que quando em excesso acaba se
tornando o nosso grande vilão.
Alterações
psicológicas como aumento da irritabilidade, ansiedade, depressão, preocupação
com o corpo e afastamento dos interesses externos são queixas comuns nas
pacientes que sofrem com as dores causadas pela endometriose.
A insônia,
diminuição do desejo sexual e alteração do apetite também pode ser frequente. A
dor exerce influência negativa na auto-estima e pode afetar a capacidade de uma
pessoa realizar tarefas associadas à vida diária , ao trabalho e à sua função
como parte da sociedade.
Conclusão
Nesse post retratamos a dor física e as
suas conseqüências no cotidiano de uma mulher portadora de endometriose. Porém não
podemos deixar de lado algumas dores, as quais classificamos como dores na alma
e/ou emocionais, que também interferem muito na nossa qualidade de vida. Como
exemplo, temos as dores provocadas pela Infertilidade. Esse tema já foi assunto
algumas vezes aqui no nosso blog mas voltaremos a abordá-lo
nos próximos post´s.
Pra finalizar, deixo com vocês esse
texto escrito por Fernanda de Marins Garcia de Souza, onde ela descreve muito
bem como é viver com dor. Acredito que muitas de nós se identifiquem com essas
palavras!!
Marília Gabriela Rodrigues
Viver com Dor.
Texto de Fernanda de Marins Garcia de Souza
Ninguém nunca planeja sua história pensando em vivê-la com dor. Na verdade, a
dor é sempre uma intrusa na vida de qualquer pessoa. Ela aparece, irrita, apavora, faz com que se procure
ajuda, é tratada e acaba, vai embora... Algumas vezes leva com ela todo o
dinheiro que se tinha, mas vai embora.
Porém existe um grupo nada pequeno de indivíduos que vivencia a dor de forma
completamente diferente. Para eles, a dor aparece, irrita, apavora, faz com que
se procure ajuda, é tratada, (algumas vezes) melhora e fica e aumenta e faz com
que se procure socorro, e fica, fica, fica. Simplesmente fica! Fica durante os
dias úteis, nos fins de semana, dias santos, período de férias, festas
familiares... Fica durante os dias e durante as noites, por vezes até mesmo nos
sonhos (para os felizes que conseguem dormir). Fica nos meses quentes e ainda
ganha mais força nos meses frios. Fica!
Então as pessoas que pertencem ao grupo dos comumente doloridos começam a se
cansar. Cansar de sentir dores e, o que chega a ser pior, cansar de ter de
provar para os outros (familiares, chefias, peritos, e, por mais incrível que
pareça, médicos) que sentem dor. Cansados, os doloridos se isolam, trancam-se
em suas casas em companhia apenas dessa intrusa mais irritante do que uma mosca
em dia de verão.
Desse ponto em diante, fecha-se o diagnóstico: os doloridos estão deprimidos e
tudo o que sentem é psicossomático. Estão doentes porque querem, porque não têm
força de vontade para reagir, porque são fracos, se acovardam frente às
dificuldades da vida. Entregaram-se e preferem se esconder atrás da dor a ter
que enfrentá-la.
Simples assim! A vítima passa à vilã, a algoz vira esconderijo e os felizardos
que têm o privilégio de não saber o que é dormir e acordar, rotineiramente, com
dor assumem o papel de juiz. Pronto. Agora que tudo está resolvido, a história
continua: O portador da dor crônica sofre diariamente, calado porque muitas
vezes não tem forças nem para reclamar, enquanto que os demais sempre que
sentem algum incômodo doloroso se irritam, se apavoram, procuram ajuda, se
tratam, ficam novamente saudáveis.
Diz um ditado popular que só conhece a quentura da panela a colher que a está
mexendo. A brilhante sabedoria popular se aplica ao tipo de sobrevivência dos
que vivem com dor crônica. Só quem sofre na "quentura dessa panela"
consegue entender o mau humor, a aparente tristeza e impaciência de seus
companheiros.
Porém, não é preciso que você se torne um de nós para que seja capaz de se
solidarizar conosco. Basta que, no dia em que sentir uma dor chata e
insistente, você imagine como seria sua vida se ela decidisse viver
constantemente ao seu lado, como uma intrusa e insuportável companheira.
Não gostou de se imaginar nessa situação? Não tem problema, para você isso é só
uma imaginação...